Equador decide entre a Revolução Cidadã e neoliberais pró-Washington

Equatorianos vão às urnas neste domingo (19) em eleições presidenciais e legislativas

Por Edu Montesanti
Especial para Caros Amigos

Neste domingo (19) será decidido no Equador, em eleições presidenciais e legislativas, se a Revolução Cidadã que rompeu com o Consenso de Washington e mudou historicamente o país sul-americano seguirá, ou se a direita que aposta na financeirização da economia retornará ao poder.

A campanha eleitoral, encerrada no dia último dia 16, esteve envolvida em mentiras e em manipulação da informação por parte da oposição, uma campanha da difamação inflada pela mídia oligárquica, ou “campanha suja” segundo o presidente Rafael Correa, eleito presidente pela primeira vez em 2006 e reeleito duas vezes (2009 e 2013).

Pois a “campanha suja recheada de demagogias não se limitou aos candidatos de oposição pró-Washington: “Na campanha eleitoral, as elites empresariais que sempre usaram as instituições estatais em benefício de seus interesses privados, tomaram a iniciativa de apresentar queixas contra a corrupção para aparecer como defensores da ética pública”, aponta o economista equatoriano Jorge Orbe León, professor do Instituto de Altos Estudos Nacionais (IAEN) de Quito, capital do Equador.

O presidenciável Lenín Moreno, do governista Movimiento Alianza PAÍS, desde o início da campanha lidera as pesquisas de opinião pública. Seus principais adversários, Cynthia Viteri e Guillermo Lasso, disputam o segundo lugar para a presidência equatoriana alternando-se na disputa pelo segundo turno: as últimas pesquisas de opinião pública divulgadas em 8 de fevereiro, apontam o ex-vice-presidente de Correa com 32,3%, Lasso com 21,5%, e Viteri com 14%. “É pouco provável que tenha segundo turno”, avalia o professor doutor Orbe.

Os resultados destas sondagens, diante de todo o jogo baixo da direita e da manipulação midiática, são um dos grandes exemplos de que a Revolução Cidadã, que ao longo dos anos sofreu constantes tentativas de golpe arquitetadas e financiadas por Washington, e até de magnicídio em 2010, soube qual caminho seguir a fim de dar continuidade às conquistas sociais, em diversos casos entre as maiores da região (a menor taxa de desemprego latino-americana hoje é do Equador: 5,3%): transformar as classes menos favorecidas não somente em consumidoras, mas em cidadãs que pudessem, junto da ascensão da extrema pobreza à classe média, resistir aos ataques das classes dominantes e de todo o tipo de manipulação midiática.

O projeto de continuidade da Revolução Cidadã, que em dez anos simplesmente triplicou o salário mínimo proporcionando ganhos reais aos trabalhadores como jamais antes, passa por isto: “Protagonismo da sociedade: alcançar maior politização da sociedade, única garantia de que qualquer mudança programática que realize a Revolução Cidadã, não seja passageira. A irreversibilidade do processo depende apenas de uma sociedade consciente de seus direitos e da importância de suas lutas históricas. Neste sentido, coloca-se muita ênfase no território, em “escutar as pessoas. Democracia radical: governar os mercados, colocar a economia a serviço da cidadania (o termo cidadania denota que o cidadão é considerado muito mais que consumidor enquanto dotado de consciência política, de igualdade de direitos diante de um Estado que lhe garante serviços básicos como saúde, educação, segurança, saneamento como direito e não como bens de consumo). Além disso, incentivar os mecanismos de participação cidadã para que a sociedade possa imiscuir-se de uma melhor maneira no governo.

Mais que tudo, a Revolução Cidadã tem transformado e se apoiado na educação, a qual, consequentemente, tem proporcionado consciência cidadã. “Em matéria de segurança, nos últimos dez anos o país deu um salto impressionante, a tal ponto que hoje  o Equador é um dos lugares mais seguros para se viver na América Latina”, lembra o docente da Iaen. É exatamente isto que está em jogo no país andino nas eleições deste dia 19: a soberania nacional e o protagonismo da sociedade em relação à história do país, tendo o exercício da cidadania como seu grande pilar.

Nesta entrevista, o economista e docente Jorge Orbe León faz um balanço dos candidatos, da própria Revolução Cidadã há dez anos no poder equatoriano, e apresenta perspectivas para o país andino.

Para o economista, que aponta importantes dados envolvendo conquistas sociais no Equador nos últimos anos, Lenín Moreno “representa a força das mudanças econômicas, políticas e sociais que a Revolução Cidadã proporcionou nos últimos dez anos no Equador, em favor dos setores sociais com menor renda”, enquanto os adversários, um retrocesso a tempos em que as elites eram as que se beneficiavam de um Estado promotor da concentração de riquezas, através do que qualifica de Estado mínimo sem sentido.

Confira a seguir a entrevista sobre uma das campanhas presidenciais mais importantes da América Latina nos últimos anos.
Caros Amigos – Qual sua visão, professor dr. Jorge Orbe, sobre os candidatos que lideram os três primeiros lugares nas pesquisas, pela ordem segundo as últimas pesquisas: Lenin Moreno (Movimiento Alianza PAÍS), Guillermo Lasso (CREO – SUMA), e Cynthia Viteri (Partido Social Cristão)?
Jorge Orbe – Nas eleições de 19 de fevereiro, a população equatoriana deverá decidir entre defender seu futuro ou um retorno ao passado.

Lenin Moreno incorpora a possibilidade de recriar um sistema político baseado na democracia participativa e na política econômica redistributiva, que promove o emprego e a recuperação econômica de grandes, médias e pequenas empresas, desde que estejam dispostas a investir com base em responsabilidade social, fiscal e ambiental.

As candidaturas de Cynthia Viteri e de Guillermo Lasso representam o desejo das elites econômicas de recuperar o poder do Estado para implementar políticas públicas voltadas à concentração da riqueza, em benefício dos setores de grandes atividades.

Quando Rafael Correa tomou posse em 2007 como presidente da República, encontrou um país destruído, propondo então a necessidade de refundar a nação com uma nova constituição que estabeleceu a base jurídica para um novo sistema econômico e político, projetado para superar os problemas gerados pelo neoliberalismo que, durante três décadas, afetou gravemente a dignidade e os interesses dos setores mais vulneráveis da sociedade.

As mudanças políticas impulsionadas pela Revolução Cidadã tornaram possível reconstruir a economia nacional e reformar o Estado, a fim de garantir os direitos econômicos, sociais e culturais da população; preparar o país para o século XXI inserindo o país, de forma inteligente, na economia mundial através de uma nova estratégia de desenvolvimento endógeno centrado no ser humano. Esta nova estratégia de desenvolvimento exclui a possibilidade do mercado, ou do Estado, tornar-se eixo da história nacional.

No início, a Revolução Cidadã descartou a possibilidade de construção de uma sociedade centrada no mercado, bem como uma sociedade centrada no Estado. Rafael Correa se propõe a estabelecer a supremacia do ser humano sobre o capital, para o qual era necessário articular uma mudança nas relações de poder observando que o ser humano não deve estar a serviço do mercado ou do Estado. Pelo contrário, o mercado e o Estado devem estar em função do interesse da sociedade e não das elites econômicos ou políticos. PAÍS visa a construção de uma sociedade com mercado, não uma sociedade de mercado com um Estado moderno e eficiente, cujas políticas são definidas com base no exercício da democracia participativa.

Lenin Moreno, candidato do Movimiento Alianza PAÍS, tem a melhor chance de sucesso uma vez que representa a força das mudanças econômicas, políticas e sociais que a Revolução Cidadã tem proporcionado nos últimos dez anos no Equador, em favor dos setores sociais de menor renda.

Guillermo Lasso é um banqueiro próspero que, em 2012, fundou uma política de acesso ao poder do partido do Estado e, a partir daí, promoveu políticas econômicas em favor do capital financeiro.

Em grande medida, sua riqueza vem dos lucros gerados por sua participação como super ministro da Economia em um governo que, em 1999, desencadeou uma crise bancária de grandes proporções, com consequências desastrosas para o país: inflação, desvalorização, recessão, falência de empresas, desemprego, aumento da pobreza e da miséria, mortes, suicídios e mais uma onda migratória na história nacional.

Cynthia Viteri pertence ao Partido Social Cristão, de direita. Seu programa propõe a defesa conservadora do capitalismo e da promoção de uma economia social de mercado.

É a favor da privatização da economia, da redução de impostos das empresas e da anulação da regulação e do controle do Estado; representa os interesses de um setor produtivo e financeiro ligado à economia agro-exportadora.

O Partido Social Cristão encarna uma postura autoritária, o tempero necessário a fim de estabelecer uma economia de mercado organizada para servir os interesses das empresas, especialmente aqueles setores empresariais que estão ligados ao mercado externo.

O candidato governista promete continuar com as políticas do presidente Correa. Em que pontos, especificamente, o senhor concorda com essas propostas? 
A meta nacional é que o Equador deixe para trás os flagelos do passado, e um deles é ter uma economia dedicada exclusivamente para a produção de commodities. Busca-se privilegiar uma economia que promova uma exportação diversificada, eco-eficiente e de valor agregado, bem como com base nos serviços economia do conhecimento e da biodiversidade. Em outras palavras, a mudança da matriz produtiva requer uma maior geração de riqueza envolvendo o desenvolvimento produtivo em outras linhas de ação, como o turismo ou as relacionadas com ciência e tecnologia, capazes de alcançar um desenvolvimento sustentável.

Para fazer isso o Estado deverá recuperar o controle sobre setores estratégicos, e definir suas prioridades na transformação da matriz energética para se deslocar de energia cara e poluente, com base em hidrocarbonetos (usinas), a uma mais barata, renovável e limpa. Neste sentido, desde 2010 foram investidos cerca de 5 bilhões de dólares na construção de oito usinas hidrelétricas para gerar energia renovável e de repotencialização de outras estações.

Neste momento, já estão em operação a Usinas Hidrelétricas Manduriacu, Sopladora e Coca Codo Sinclair as quais, com a Hidropaute, Mazar e outras que se incorporem como Toachi Pilatón, Delsitanisagua e Minas-San Francisco, serão pilares da mudança da matriz energética. Desde novembro de 2016, o país já exporta energia para Colômbia e Peru.

Assim, podemos dizer que a nova matriz energética, com base na geração de energia limpa e renovável, é quase completa, embora no longo prazo, a falta ainda a ser feito; não a mudança da matriz produtiva, como a economia equatoriana permanece primário-exportadora. Portanto, para superar essas limitações, é necessário promover investimentos de longo prazo público-privadas, especialmente os que estão relacionados com o conhecimento e as novas tecnologias.

A mudança da matriz produtiva coloca o desafio de aumentar as exportações de produtos equatorianos mais representativos, mas com alto valor agregado, ou seja,processando-os bem como reduzindo as importações e aumentando a produção doméstica. Este processo requer o investimento produtivo sustentável, especialmente nas áreas da educação e tecnologia de processo de ponta.

Em matéria de segurança, nos últimos dez anos o país deu um salto impressionante, a tal ponto que hoje o Equador é um dos lugares mais seguros para se viver na América Latina. O relatório do Igarapé Institute Homicide Monitor, publicado no ano passado, atestou que as cidades equatorianas de Ambato, Quito e Cuenca estão entre as dez mais seguras em toda a América Latina. A medição foi feita levando em consideração a taxa de homicídios por 100 mil habitantes. No entanto, há muito a ser feito, especialmente para controlar o micro-tráfico e no combate ao crime organizado transnacional.

Os principais candidatos da oposição propõem a eliminação de diversas instituições públicas – no caso de Lasso, do Ministério de Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação (Senescyt), e do Conselho de Participação Cidadã e Controle Social (CPCCS), enquanto Viteri, do Conselho de Participação Cidadã e Controle social. Afirma a Organização Internacional do Trabalho que o Equador é o segundo país com o menor percentual de funcionários públicos da América Latina, a maioria deles concentrados no setor de educação e saúde. Portanto, o esvaziamento proposto por Lasso e Viteri não reduziria o número de médicos e professores? Sua visão sobre tudo isso, professor Orbe.

Logo após ter encontrado instalações destruídas, tais como estradas, escolas, colégios, universidades e hospitais públicos, o governo de Rafael Correa assumiu a responsabilidade de investir, em dez anos, 22 bilhões de dólares no setor de educação e 16 bilhões de dólares em saúde.

Agora, as crianças e os jovens dão continuidade aos estudos em edifícios modernos com laboratórios adequados e professores treinados. Para melhorar a qualidade da educação, a política educacional também incluiu a formação e avaliação dos professores.

A formação de professores é prioridade, mas também foram proporcionados aumentos salariais: em 2006, um professor recebia um salário entre 90 e 200 de dólares por mês; hoje seu salário varia entre 600 e 1.600 dólares.

No Ensino Superior, estabeleceu-se um sistema de crédito e certificado universitário, o qual levou ao fechamento de 17 universidades que não cumpriam as normas exigidas pré-estabelecidas.

Agora, de acordo com a Unesco o Equador é o segundo país que mais progrediu em educação na região, e o que mais investiu em ensino superior: 2% do PIB (2 bilhões de dólares), embora ainda haja muito a ser feito.

A melhora na qualidade e a ampliação da educação gratuita fizeram que, entre 2007 e 2015, aumentassem as matrículas nas faculdades entre os mais pobres, cujos indicadores aumentaram de 36,5% para 57,3%. Agora, 60% dos jovens desfrutam de educação pública com o desafio de melhorar ainda mais a qualidade.

A atenção às pessoas com deficiência deixou de ser uma dádiva para se tornar política de Estado. Entre 2007 e 2012, o trabalho do vice-presidente Lenin Moreno concentrou-se na área social. O objetivo principal foi oferecer qualidade de vida às pessoas com deficiência, e implementar o conteúdo da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. O processo começou declarando estado de emergência para todo o sistema de prevenção de deficiência física, depois foram oferecidos atenção e fornecimento de ajudas técnicas e produtos médicos, acessibilidade, registro e capacitação.

No Equador, a mudança foi drástica: até 2006 se atendia 5 mil pessoas, e em 2015 esse número chegou a mais de 128 mil cidadãos de todas as idades atendidos, muitos deles em situação de pobreza extrema. O acesso dessas pessoas a um melhor nível de vida é reconhecido na Constituição como direito; a partir disso, o governo encarrega-se de proporcionar às pessoas com deficiência acesso à moradia digna. Até 2017, o governo planeja entregar 20 mil casas para pessoas com deficiência. O programa Manuela Espejo é referência na América Latina e reproduzida em outros países, com conselhos e assistência no Equador.

A prioridade do governo foi melhorar a saúde pública: o investimento acumulado em saúde ao longo da última década foi de cerca de 16 bilhões de dólares. Apenas em 2015, mais de 1.800 bilhões de dólares foram investidos, ou seja, três vezes mais que os 535 milhões de dólares investidos em 2006.

O presidente Correa ressaltou, em várias ocasiões, que por vários anos antes do seu governo não se havia construído no país e nem sequer um único hospital público. Na última década, no entanto, 11 hospitais e 51 centros públicos de saúde foram inaugurados. A cidadania recuperou sua confiança: os cuidados médicos no sistema público de saúde aumentaram de 16 milhões em 2006 para 39 milhões de pacientes em 2015. Para melhorar os serviços de saúde, o Estado contratou milhares de profissionais capacitados, nacionais e estrangeiros. Entre 2008 e 2015, o Estado contratou 34 mil médicos.

Na segurança social, os números são igualmente relevantes: os beneficiários passaram de 1,57 milhões para 3,5 milhões, elevando a demanda por serviços, especialmente de saúde. Neste contexto, o Estado assinou um acordo com os hospitais privados para receber pacientes, mas o custo excessivo fez com que esse sistema ficasse limitado. Em 2015 foram desembolsados 780 milhões de dólares, mas investigações encontraram superfaturamento, por isso tomou-se a decisão de construir novas casas com fundos próprios de saúde.

Os candidatos empresariais propõem cortes de impostos e redução de funcionários do governo, o que significaria o advento de uma lenta agonia das instituições do Estado e do público a fim de privatizar serviços públicos, especialmente em energia, comunicações, educação e saúde. Redução de impostos envolve cortar os direitos econômicos e sociais da maioria da população.

Viteri e Lasso coincidem no que diz respeito à derrubada de restrições à importação, à eliminação dos impostos entre outras coisas sobre a evasão de divisas e as terras agrícolas. A candidata do Partido Social Cristão propõe autonomia e independência do Banco Central, assinatura de um acordo comercial com os Estados Unidos. Essas propostas não visam beneficiar o alto empresariado, os banqueiros e os exportadores configurando-se  claramente em benefícios pessoais de uns poucos, em detrimento da maioria da sociedade equatoriana? O que significaria ao Equador a política econômica prometida por ambos os candidatos oposicionistas?
De acordo com dados fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística e Censos (INEC), entre 2007 e 2016 a pobreza por renda a nível nacional caiu de 62% para 44% da população, e a pobreza extrema caiu seis pontos percentuais, ficando em 10% em março 2016. Na última década, mais de um milhão de equatorianos deixaram a pobreza extrema. Uma das razões para esses resultados é a cobrança de impostos melhorada e a redistribuição da riqueza, traduzida em investimentos que beneficiam as pessoas e melhoram a qualidade de vida. Nos últimos dez anos, essas pessoas passaram a fazer parte da classe média.

Em relação à pobreza por necessidades básicas insatisfeitas, em 2008 o número chegou a 47%, enquanto que em 2015, caiu para 32%. A questão da equidade foi uma das questões mais controversas durante o último período de governo de Rafael Correa. Entre 2007 e 2015, o quinto mais pobre da sociedade dobrou sua renda mensal per capita. Em 2006, os 10% mais ricos registravam 42 vezes mais que os 10% mais pobres. Essa lacuna foi reduzida em 25 vezes. A desigualdade é um problema global que afeta também o Equador e, sem dúvida, Rafael Correa trabalhou para superar, com progressos consideráveis, mas os desafios permanecem.

Entre 2007 e 2015, trabalhou-se para melhorar obras de saneamento, especialmente no setor rural. Foram realizados progressos significativos na cobertura de serviços de eliminação de excrementos (de 41% para 72%). A isso se somou a redução da superlotação, de 28% para 15% de acordo com levantamento realizado pelo INEC. A erradicação do trabalho infantil e de adolescentes (5 a 17 anos) também foi diminuída em seis pontos. Em 2007, o índice situou-se em 12,5%, enquanto em 2015 esse percentual caiu para 5,9%.

Entre 2007 e 2016 investiu-se 357 milhões de dólares em renovação da Rede Nacional de Aeroportos e, de acordo com o Fórum Econômico Mundial, entre 2006 e 2015 o Equador subiu 57 posições no ranking de melhor qualidade neste processo; antes, o país havia sido classificado na 82ª posição, e hoje está na 25ª.

De 2007 a 2016, o atual governo tem investido cerca de 10 bilhões de dólares para melhorar a rede rodoviária estadual; este investimento mudou a vida de milhares de pessoas e revigorou a economia do Equador. Diante disso, várias empresas estrangeiras hoje estão interessadas em investir no Equador: as concessões dos portos de Manta, Posorja e Puerto Bolívar trouxeram um investimento de 2.1 bilhões de dólares que vêm de multinacionais com sede na Turquia, no Chile e em Dubai.

Há dez anos eram muito comuns as inundações no inverno, bem como a seca que impedia o plantio nos meses de verão. Esse cenário foi deixado para trás, especialmente para aqueles que vivem em comunidades próximas de rios, ou aqueles que vivem da agricultura. Para resolver este problema, o governo investiu mais de 1 bilhão de dólares em seis projetos universais que protegem milhares de hectares de plantações. O fenômeno do El Niño, registrado em 2015, não teve o mesmo efeito devastador de anos anteriores, precisamente por causa desses edifícios. Atualmente, 142 mil hectares de terras beneficiam-se da infra-estrutura criada para o controle de inundações.

Em suma, o governo da Revolução Cidadã recuperou o público. Um relatório especial do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) colocou o Equador acima do nível regional, sobre a eficiência dos serviços públicos. Em 2011, o país ocupava o 15º lugar, e já no final de 2015 subiu para a sexta colocação.

Este progresso acompanha a valorização do trabalho de servidores públicos. De acordo com o Orçamento Geral do Estado consolidado por Grupo de Gastos de 2016, a categoria de salários e vencimentos dos funcionários públicos representam 29% do Orçamento Geral do Estado; ou seja, 8,9% do produto interno bruto. As normas internacionais exigem que esta despesa não deve exceder, em média, 25% do orçamento.

Uma das premissas do atual governo é que “o público deve ter alta qualidade”. O início da mudança – e o mais visível – foi a moralização das entidades públicas. Nos governos anteriores, a ideia de que o público não valia a pena e, por isso, muitos serviços acabaram privatizados como luz e telefone empresas, tornou-se generalizada. Entre as instituições que experimentaram modernização e mudanças estão o Registro Civil (cartórios equatorianos), empresas elétricas, Correios do Equador, a Corporação Nacional de Telecomunicações, instituições de justiça e, em geral, todas as entidades estatais. Todos são guiados por um princípio básico: prestar um bom atendimento ao cidadão. Esta década também mudou a visão do funcionário público, e o valor da eficiência.

Uma política econômica como a delineada pelos candidatos Cynthia Viteri e Guillermo Lasso, representa o retrocesso de todos os avanços descritos acima. Agora que se modernizaram as instituições e os serviços públicos, as elites empresariais estão tentando privatizar esses serviços, já que isso significa uma grande oportunidade de negócio em seu favor.

Nas condições históricas do Equador hoje, o desejo das elites empresariais é aproveitar o grande investimento público nos últimos anos, o que traria aumento dos custos dos serviços públicos, especialmente em comunicações, eletricidade, segurança, educação e saúde, e os consequentes cortes nos direitos sociais para a maioria da população.
Quais os principais desafios econômicos, políticos e sociais do Equador hoje?
Devido à queda dos preços internacionais do petróleo, a crise econômica e financeira da União Europeia, a valorização do dólar e os danos causados pelo terremoto, o país teve que aumentar o nível de dívida externa e estabelecer medidas de segurança, para controlar o déficit da balança de pagamentos. Como o Equador não tem moeda própria, o governo foi forçado a adquirir dívida pública que, atualmente, representa 37% do PIB. Embora não era apropriado na fase descendente do ciclo fazer um ajuste fiscal deste tipo, o novo governo terá de fazê-lo. O problema é se os custos do ajustamento vão afetar os pobres, ou se se protege os setores mais vulneráveis da sociedade.

O Equador não precisa de menos Estado, conforme proposto por opositores ao governo. Pelo contrário, é necessário um Estado forte e eficaz, capaz de apoiar todos os esforços produtivos e redistributivas necessários para garantir os direitos econômicos e sociais da população. Precisamos de eficiência no Estado, mas não a eficiência definida como o ajuste e a diminuição de funcionários públicos, especialmente professores, médicos, policiais, como querem os opositores à Revolução Cidadã. Precisamos da eficiência de um Estado capaz de apoiar seus cidadãos, com os serviços básicos que visam garantir os direitos sociais.

Um dos aspectos sobre os quais gira a campanha eleitoral no Equador, é a necessidade de criação de emprego. Além da declaração geral, os candidatos não explicaram as estratégias para este fim. O assunto é complicado quando, por razões de concorrência e competitividade, as empresas incorporam regularmente máquinas e ferramentas que economizam trabalho e jogam vastos setores da população ao desemprego e ao subemprego. Nestas circunstâncias, incapazes de vincular-se com a “economia formal”, com o setor empresarial privado, segmentos significativos da população urbana impulsionam estratégias de sobrevivência relacionados com empresas familiares e emprego informal.

Um Relatório sobre Investimento Estrangeiro Direto na América Latina e no Caribe, elaborado pela CEPAL em 2012, mostra que a repatriação de lucros para o exterior chega a 92% do lucro do investimento direto estrangeiro na região. Por outro lado, as empresas transnacionais são uma fonte secundária de criação de emprego uma vez que, entre 2003 e 2013, contribuíram com apenas 5% da criação líquida de empregos na América Latina. As atividades de comércio e de construção são as que criam mais postos de trabalho (sete empregos para cada milhão de dólares investidos), seguidas pela indústria e serviços (três postos de trabalho). As atividades mineiras, incluindo o petróleo, criam um posto de trabalho para cada dois milhões de dólares.

De acordo com a última Pesquisa Nacional de Emprego e Desemprego realizada pelo Instituto Nacional de Estatística e Censos, em junho de 2016 o desemprego no Equador situou-se em 5,3%. No entanto, o subemprego em todo o país atingiu 19,9%, enquanto o trabalho formal chegou a 41,2%.

Da mesma forma, de acordo com a última Pesquisa Nacional de Emprego e Desemprego do Instituto Nacional de Estatística e Censos, a população economicamente ativa, ou seja, o número de pessoas capazes de trabalhar no Equador aumenta em mais de 200 mil pessoas por ano. Se assumirmos que a grande indústria precisa investir 100 mil dólares para gerar uma fonte de emprego direto, o país precisaria de um investimento anual de 20 bilhões de dólares por ano para atender a demanda de trabalho formal incorporado na indústria! Daí a necessidade de se promover o desenvolvimento de pequenas e médias empresas que necessitam de menor capital de investimento, de preferência utilizando matérias-primas nacionais e emprega mais trabalhadores.

A questão que se coloca é: apesar das mudanças promovidas pelo atual governo sob a racionalidade atual do mercado capitalista que domina a economia mundial, a economia equatoriana pode criar o emprego necessário para atender o número de pessoas que se incorpora a cada ano no mercado de trabalho, ou, inversamente, é necessária uma transformação estrutural que abra uma nova etapa no desenvolvimento histórico do país e da humanidade?

Finalmente, eu gostaria de ressaltar que uma dívida do governo de Rafael Correa tem relação com falhas existentes na luta contra a corrupção. No momento, deve-se notar que, em uma declaração pública divulgada no mês passado, o Gabinete do Controladoria-Geral afirmou que, em 2.172 relatórios de auditoria tinham estabelecido glosas 33.000 ordens de reintegração de funcionários públicos para 661 milhões de dólares. Apesar de ter entregue esses relatórios para o Ministério Público, não se sabe ainda ações instituição tomadas a este respeito.

Na campanha eleitoral, as elites empresariais que sempre usaram as instituições estatais em benefício de seus interesses privados, tomaram a iniciativa de apresentar queixas contra a corrupção para aparecer como defensores da ética pública.

Sobre os resultados, na minha opinião é pouco provável que tenha segundo turno. No entanto, se for o caso, o que se dará entre Lenín Moreno e Guillermo Lasso, o que significa uma disputa entre o capitalismo redistributivo contra o neoliberalismo em estágio avançado;  capital financeiro internacional contra o capital produtivo com afã de acumulação nacional; a democracia republicana formal contra o autoritarismo financeiro despótico; a defesa do Público contra a privatização em estágio avançado; teologia sem libertação contra o Opus Dei.
Tendo e vista que o Equador tem alcançado maior soberania e, consequentemente, destaque na região nos últimos anos, diferentemente do que acontecia antes da Revolução Cidadã, qual a importância para a atual conjuntura da América Latina as eleições deste dia 19 de fevereiro em seu país?

Após as mudanças políticas no Brasil e na Argentina, o ano de 2016 para a América Latina significou o retorno do neoliberalismo e do poder econômico das elites. Neste momento existe o risco no Equador, o que confirma aquilo que se tem denominado como o fim do ciclo de governos progressistas na região.

Como é sabido, no início do século XXI foram estabelecidos vários governos progressistas na América Latina. Desde então, o pensamento político da região tem sido caracterizado pela defesa do Estado em favor dos setores mais vulneráveis, a defesa da soberania nacional em uma escala continental, a busca da satisfação das necessidades básicas para a maioria da população, o caráter nacional-popular de políticas públicas e o desenvolvimento de uma democracia econômica e social que se estende à democracia formal republicana.

Tudo isso está em jogo, mas também a possibilidade de que a América Latina constitua em um bloco econômico e político autônomo, que negocie seus interesses de forma soberana com Estados Unidos, China, Rússia e União Europeia, pois o Equador tem desempenhado papel ativo no processo de integração latino-americana.


Articles by: Jorge Orbe León and Edu Montesanti

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